ESTADÃO: O jornal que vendeu o Brasil - 150 anos de Golpes, Mentiras e Crimes contra a Democracia
- Redação d'O estopim
- 16 de ago.
- 8 min de leitura
Atualizado: 27 de ago.
PRIMEIRA REPORTAGEM DA SÉRIE “DOSSIÊ MESQUITA: como a família que “criou” três ditaduras fabricou a própria história de “resistência” e transformou jornalismo em máquina de guerra contra o povo brasileiro.
Por uma questão de honestidade intelectual e transparência jornalística, a investigação para esta série se baseia exclusivamente em documentos oficiais, pesquisas acadêmicas, denúncias do Ministério Público e depoimentos de jornalistas do próprio Estadão. Não há aqui opinião pessoal, mas fatos documentados sobre um dos maiores escândalos da imprensa brasileira.
Imaginem um jornal que se vangloria de defender a democracia, mas que na verdade conspirou ativamente para derrubar três governos democraticamente eleitos. Um veículo que se apresenta como "independente", mas serve historicamente aos interesses de uma única família de oligarcas paulistas. Uma empresa jornalística que prega ética profissional, mas praticou o maior caso de plágio da história do jornalismo brasileiro e fabrica notícias falsas contra ministros de Estado.
Este jornal existe. Chama-se O Estado de S. Paulo, conhecido como Estadão. E sua história é muito diferente da narrativa heroica que ele próprio construiu sobre si mesmo.
Durante seis meses, esta investigação reuniu mais de 50 fontes documentais - pesquisas acadêmicas, arquivos históricos, denúncias do Ministério Público, depoimentos de jornalistas e documentos oficiais - para reconstituir 150 anos de atuação contra os interesses nacionais de um veículo que deveria informar, mas que sistematicamente desinforma, manipula e conspira.
O resultado é chocante: o Estadão não é um jornal. É um aparelho ideológico de dominação a serviço das elites econômicas, disfarçado de jornalismo.

O DNA GOLPISTA: CONSPIRAÇÕES E DITADURA
1932: O Batismo de Sangue da Família Mesquita
A vocação golpista do Estadão nasceu cedo. Em 1932, durante a Revolução Constitucionalista, a sede do jornal foi transformada em um verdadeiro quartel-general. Como mostram Capelato e Prado em O Bravo Matutino (1980), a redação do periódico funcionava como base revolucionária, onde eram feitos recrutamentos de combatentes e distribuídas armas em apoio ao levante contra o governo de Getúlio Vargas. Não se tratava de jornalismo, mas de insurreição armada organizada a partir das páginas e dos corredores do diário.
O diretor do jornal, Júlio de Mesquita Filho, não se limitou a registrar os fatos: tornou-se um dos principais líderes civis da revolta, articulando intelectuais, empresários e setores militares em defesa da causa paulista. O Estadão atuava como porta-voz dos constitucionalistas, produzindo editoriais que mais pareciam manifestos de guerra. Sua tipografia imprimia panfletos e comunicados para as frentes de batalha, enquanto a redação era usada para convocar voluntários. Como observa Maria Helena Capelato, a palavra impressa passou a funcionar como uma arma tão importante quanto os fuzis.

O preço dessa aventura foi alto. Quando a Revolução Constitucionalista foi derrotada pelo Exército de Vargas, a própria família Mesquita pagou o custo. Segundo Capelato (1980), membros da família se envolveram diretamente na articulação e no front de combate. Ao final, Júlio de Mesquita Filho foi preso, exilado em Portugal, e o Estado de S. Paulo passou a ser administrado sob intervenção federal por mais de um ano. O que era apresentado como jornalismo serviu, na prática, de plataforma para a insurreição — e quem apostou nela sofreu as consequências da derrota.
Esse episódio marcou para sempre o caráter político do jornal. Mesmo após a intervenção, o Estadão preservou sua identidade antipopulista e seguiu atuando como um ator político, e não apenas como veículo de informação. Como lembram Capelato e Prado, ao longo das décadas seguintes a família Mesquita se opôs a qualquer política de cunho popular ou trabalhista, consolidando um padrão editorial de resistência às transformações sociais. O batismo de sangue de 1932 não foi um acidente: foi o início de um DNA golpista que faria da imprensa um instrumento de conspiração permanente contra governos que ousassem enfrentar os interesses das elites.
1964: O Estadão como “Ministério do Golpe”
Foi em 1964 que o jornal O Estado de S. Paulo – o Estadão – revelou sua verdadeira face. Pesquisas históricas e testemunhos da época comprovam que seu diretor Júlio de Mesquita Filho esteve entre os artífices do golpe militar, envolvido até o último fio na conspiração. O jornalista Carlos Chagas, que cobriu aqueles eventos, aponta Mesquita Filho como “um dos artífices do golpe de 1964, metido até o pescoço na conspiração”, ao lado de Roberto Marinho (dono de O Globo). Em outras palavras, o Estadão não foi um observador passivo – ele participou ativamente da queda de João Goulart.
Conspiração e Golpe: O Estadão no centro
Os fatos documentados são estarrecedores e desmontam de vez o mito de uma imprensa “apolítica” naquele período:
Diretrizes para o golpe: já em 1962, oficiais conspiradores (como Cordeiro de Farias e Orlando Geisel) reuniram-se com Júlio de Mesquita Filho em São Paulo e lhe entregaram um documento com “normas” para orientar o governo militar após a queda de Jango. O dono do Estadão não apenas apoiou a ideia – entusiasmou-se e sugeriu nomes para compor um futuro ministério “revolucionário” (oito nomes, incluindo Roberto Campos e Milton Campos, quatro dos quais acabariam realmente integrando o novo governo).
“Roteiro da Revolução”: Mesquita Filho esteve diretamente envolvido na elaboração do plano golpista. Junto com o jurista Vicente Rao (advogado ligado a grupos empresariais), ele redigiu um documento intitulado “Roteiro da Revolução”, que delineava medidas extremas a serem tomadas logo após a tomada do poder. Nesse roteiro – enviado a generais conspiradores como Emílio Garrastazu Médici – defendia-se, por exemplo, dissolver o Congresso Nacional (Senado e Câmara), cassar mandatos de governadores e prefeitos e suspender o habeas corpus. Em suma, o diretor do Estadão ajudou a escrever, antes mesmo do golpe, o esboço do autoritarismo que seria imposto ao país. De fato, Mesquita e Rao chegaram a preparar o rascunho de um Ato Institucional nesses moldes, antecipando o que o regime militar logo faria virar realidade.
Base da conspiração: as instalações e recursos do Estadão foram colocados a serviço dos golpistas. A sede do jornal tornou-se base conspiratória, onde civis e militares tramavam a derrubada do governo legítimo. Em junho de 1963, por exemplo, após um grande comício oposicionista no estádio do Pacaembu, um grupo seleto de conspiradores reuniu-se no apartamento de Júlio Mesquita Filho – que ficara encarregado de coordenar o apoio midiático aos ativistas . Ou seja, o próprio diretor do jornal oferecia espaço e suporte logístico para a conspiração. Décadas depois, seu irmão Ruy Mesquita admitiria sem rodeios: “Não só apoiamos, como conspiramos”.
Em outras palavras, o Estadão não apenas apoiou o golpe militar – ele ajudou a escrevê-lo e operacionalizá-lo. Júlio de Mesquita Filho usou a pena e a influência do jornal para pavimentar o caminho do regime de força.
Clamando por mais Ditadura
Após a queda de João Goulart, o Estadão não se contentou em celebrar a vitória dos golpistas – passou a exigir uma ditadura ainda mais dura. Desde os primeiros dias do novo regime, seus editoriais assumiram tom eufórico e beligerante. O jornal propagava que “toda a população brasileira aplaudia” a “Revolução” de 31 de Março e incitava os militares a levar “às últimas consequências” a “operação de limpeza” no Estado brasileiro. Em textos virulentos, o Estadão pregava a “necessidade de erradicação total” dos “soviets da Petrobrás” e a “decapitação da hidra vermelha” – metáforas para aniquilar por completo os focos de esquerda (sindicatos, estudantes, comunistas) remanescentes no país.
Nos anos seguintes, o diário paulistano continuou cobrando mais radicalização do regime que ajudara a instaurar. Em outubro de 1965 – apenas um ano e meio após o golpe – um editorial do Estadão acusou o governo Castelo Branco de manter “em banho-maria esta Revolução meio anêmica”. O jornal protestava que os militares ainda não haviam decretado nem mesmo um estado de sítio para acelerar a “limpeza” política, reclamando das “tibiezas, hesitações e subterfúgios” dos governantes. Exigia-se abertamente a edição de “um segundo Ato Institucional” para permitir mais cassações de políticos “subversivos” e “corruptos” que ainda restavam.
Dias depois, atendendo a esses clamores, o marechal Castelo Branco decretou o Ato Institucional nº 2 (AI-2), endurecendo de vez o regime. E qual foi a reação do Estadão? Puro regozijo. “Revolucionários que somos, admitimos o recurso a medidas de exceção”, anunciou o jornal, justificando o AI-2 – já que, segundo ele, era impossível atingir “pela via legalista” os objetivos que motivaram o Movimento de 1964. Em editorial triunfante, o Estadão aplaudiu o novo Ato Institucional, mesmo reconhecendo, em tom quase cínico, que
“essas medidas de exceção representam uma faca de dois gumes” e poderiam “abrir o caminho para a ditadura”.
Mas essa ressalva final soava hipócrita: o próprio jornal havia incitado os ditadores a serem mais ditatoriais. De fato, o Estadão literalmente pediu mais ditadura – e os ditadores obedeceram.
O VEREDICTO DA HISTÓRIA CONTRA OS TRAIDORES DA DEMOCRACIA
O Estadão não é apenas mais um jornal — é o arquivo vivo de 150 anos de traição à democracia brasileira. Todos os fatos aqui apresentados, respaldados por documentos oficiais, pesquisas acadêmicas, denúncias do Ministério Público e testemunhos de jornalistas do próprio Estadão, atestam que este veículo, longe de ser guardião da liberdade, foi agente direto de golpes, manipulações e crimes contra a República.
Desde 1932, quando transformou sua redação em quartel-general golpista, recrutando combatentes e distribuindo armas para insurreições armadas, o Estadão tornou-se protagonista de episódios que mudaram o curso do país não pela força da verdade, mas pela força do interesse privado. Em 1964, repetiu o script: atuou como cérebro conspirador do golpe militar, redigiu diretrizes para generais, ofereceu sua infraestrutura ao plano golpista, e exigiu, por meio de editoriais, não só a deposição do governo legítimo, mas a radicalização do regime; clamou abertamente por medidas autoritárias e a extinção dos adversários políticos. Não foi jornalismo. Foi insurreição aliada ao terrorismo de Estado.
Só mudou seu discurso — e iniciou sua farsa de “resistência” — quando o regime que ajudou a consolidar passou a ameaçar os interesses da própria família Mesquita, como veremos a seguir. Assim, o Estadão converteu sua covardia em heroísmo, sua omissão em resistência, sua cumplicidade em vitimização, em um dos maiores golpes de falsificação histórica já perpetrados por um veículo da imprensa mundial.
O padrão criminoso se perpetua: seja através da fabricação de notícias falsas, do maior caso de plágio já relatado no jornalismo brasileiro, de campanhas sistemáticas de perseguição política e manipulação da opinião pública, de ataques canalizados a instituições do Estado Democrático de Direito, o Estadão atuou e atua como máquina de guerra contra governos populares e políticas que contrariam os interesses de uma aristocracia midiática. Não apenas conspirou contra três governos eleitos democraticamente, mas construiu, ao longo das décadas, uma estrutura de poder capaz de decidir presidentes, fabricar crises institucionais e promover golpes sob a máscara da liberdade de imprensa.
O perigo do Estadão não é coisa do passado. A cada ciclo histórico, seus métodos mudam, mas o DNA golpista permanece: editoriais virulentos, manipulação escancarada dos fatos, articulação ativa com forças antidemocráticas e uma posição sistematicamente contrária aos avanços sociais. O jornalismo é abandonado em nome da manutenção do poder da família Mesquita e seus aliados, enquanto o público brasileiro, mantido sob o véu da desinformação, é conduzido a apoiar projetos que sabotam os próprios interesses nacionais.
O Estadão é apenas mais um rosto de uma doença estrutural: a concentração quase feudal dos meios de comunicação nas mãos de poucas famílias. O resultado é uma democracia frágil, refém de interesses privados, incapaz de garantir ao povo acesso à verdade — e, portanto, de materializar a soberania popular.
O tempo da ingenuidade acabou. Não há mais desculpas. Os arquivos estão livres, as vozes dos que viveram o terror golpista se multiplicam, e a própria família Mesquita já admitiu, sem pudor, sua participação nos maiores ataques à democracia do Brasil. O Estadão é instrumento de dominação, fábrica de golpes, produtor de mentiras institucionalizadas.
Cabe a nossa geração decidir: aceitaremos esse pacto tácito com a traição ou vamos enfrentar de vez os inimigos internos da democracia? A luta agora é pela proteção do espaço público contra a manipulação e pelo fim do monopólio do discurso. Ou o país exige uma imprensa livre, ética, plural e verdadeiramente democrática — ou será condenado a repetir, indefinidamente, os ciclos de falsificação, autoritarismo e tragédia.
A máscara caiu. O rei está nu. E agora a verdade clama por justiça e ação. O futuro da democracia brasileira depende da coragem de olhar para os fatos, romper com o silêncio cúmplice e conquistar, finalmente, uma imprensa digna, do povo e para o povo.
Comentários