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As estratégias apresentadas pelos advogados de Jair Messias Bolsonaro no julgamento histórico do Supremo Tribunal Federal revelam uma defesa construída principalmente sobre a negação de participação direta nos eventos que culminaram nos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023. Contudo, ao confrontar os argumentos defensivos com o volumoso material probatório reunido pela Procuradoria-Geral da República, emergem fragilidades significativas que podem comprometer a eficácia da estratégia adotada.


O ex-presidente Jair Bolsonaro / Crédito: Ton Molina/STF
O ex-presidente Jair Bolsonaro / Crédito: Ton Molina/STF

A estratégia da ausência de provas diretas


O advogado Celso Sanchez Vilardi, representando o ex-presidente, centrou sua defesa na alegação de inexistência de "uma única prova" que conecte Bolsonaro aos planos golpistas.


"Não há uma única prova que atrele o presidente a punhal verde e amarelo, a operação luneta e ao 8 de janeiro", declarou na tribuna do STF, referindo-se aos principais elementos investigativos do caso.

Esta linha argumentativa, entretanto, contrasta frontalmente com o detalhado relatório da PGR, que documenta uma:


"trama conspiratória armada e executada contra as instituições democráticas", onde "a conjuração tem antecedentes que a explicam e se desenvolve em fases, momentos e ações ao longo de um tempo considerável".

A denúncia ministerial apresenta evidências de que "os membros da organização criminosa estruturaram, no âmbito do Palácio do Planalto, plano de ataque às instituições", incluindo o sinistro "Punhal Verde Amarelo", que previa até mesmo "a morte por envenenamento de Luiz Inácio Lula da Silva" e o uso de "armas bélicas contra o Ministro Alexandre de Moraes".


Principais estratégias de defesa de Jair Bolsonaro

Estratégia de Defesa

Fundamentos e Sustentações

Pontos-Fracos / Vulnerabilidades

Ausência de participação em reuniões de golpe

– Nega ter articulado qualquer plano de exceção ou golpe com generais


– Testemunhas militares afirmam não terem sido convocadas por ele

– Vários registros (“Operação Luneta”, “Punhal Verde Amarelo”) indicam planejamento detalhado


– Presença em live de 29/7/21 incentivando força militar

Não envolvimento em “caderneta golpista”

– Alega manipulação parcial de arquivo de anotações (“agenda”) de Gen. Heleno


– Testemunhas reforçam desconhecimento da “caderneta”

– Agenda continha diretrizes estratégicas claras de deslegitimação das urnas e plano de abolição do processo democrático

Defesa da legalidade das Forças Armadas

– Sustenta ter sido aconselhado por generais contra o golpe


– Destaca permanência de ministros da ativa fiel à Constituição

– Provas de pressão interna sobre Comandantes do Exército e de reuniões para induzir adesão ao golpe

Ataques meramente discursivos às urnas

– Alega expor apenas suspeitas infundadas, sem pretensão de golpe


– Rivais do TSE não teriam prova de fraude

– Discursos gravados convocam “uso da força” se necessário e ameaçam ministros do STF e TSE

Falha probatória da PGR

– Questiona credibilidade dos delatores (Mauro Cid)


– Destaca contradições e omissões em depoimentos

– Depoimentos corroborados por documentos encontradas em ABIN e GSI;


– Metadados de arquivos provam planejamento conjunto

Separação de poderes e “iniciativa de fontes”

– Alega atuação independente de órgãos (PF, AGU) sem ingerência pessoal

– Planilhas e minutas foram elaboradas dentro do Palácio do Planalto e compartilhadas diretamente com Bolsonaro

O questionamento sobre cerceamento de defesa


Outro pilar da estratégia defensiva foi o alegado cerceamento de defesa, particularmente em relação ao acesso às provas digitais. Vilardi argumentou que receberam "70 teras" de material compactado, questionando a possibilidade de análise adequada no tempo disponível.


"Todo material constante nesses SharePoints ultrapassa a marca de 20 TB compactados", declarou.

Contudo, este argumento encontra limitações quando confrontado com a própria admissão de que:


"as provas eleitas pela Polícia Federal, as provas eleitas pela denúncia foram colocadas nos autos e estão à disposição desta defesa e de todas as defesas", segundo o próprio advogado.

Um dos momentos mais reveladores da defesa foi a tentativa de desvinculação de Bolsonaro da chamada "minuta golpista". O advogado sustentou que:


"a tal minuta é uma peça encontrada no celular do colaborador, que em seus depoimentos disse que não transmitiu a ninguém".

Porém, a PGR apresenta evidências contundentes de que:


"foram concebidas minutas de atos de formalização de quebra da ordem constitucional" e que "o Presidente da República à época chegou a apresentar uma delas, em que se cogitava da prisão de dois Ministros do Supremo Tribunal Federal e do Presidente do Senado Federal".

A defesa tentou questionar a tipificação dos crimes alegando ausência de "violência ou grave ameaça". Vilardi argumentou que:


"não é possível se falar em início da execução numa live do TSE, aonde está a violência ou grave ameaça?"

Esta linha argumentativa ignora o entendimento jurisprudencial de que os crimes tipificados nos artigos 359-L e 359-M do Código Penal "referem-se a crimes de atentado, que prescindem do resultado naturalístico para se consumar", conforme estabelece a própria denúncia da PGR.


Talvez o mais frágil dos argumentos apresentados foi a tentativa de invocar o artigo 15 do Código Penal, alegando desistência voluntária. O advogado Paulo Amador sustentou que:


"quem desiste voluntariamente do início da execução do delito responderá apenas pelos atos já praticados".

Esta tese esbarra na robusta documentação apresentada pela PGR de que a organização criminosa:


"não desistiu da tomada violenta do poder nem mesmo depois da posse do Presidente da República eleito", culminando nos eventos de 8 de janeiro, onde "a última esperança da organização estava na manifestação".

As evidências documentais da PGR


O conjunto probatório reunido pela Procuradoria-Geral da República inclui documentos que revelam planejamento sistemático. As anotações encontradas na agenda de Augusto Heleno, por exemplo, incluíam "estabelecer um discurso sobre urnas eletrônicas e votações" e "é válido continuar a criticar a urna eletrônica", demonstrando coordenação prévia dos ataques ao sistema eleitoral.


Particularmente significativo é o documento encontrado com Alexandre Ramagem, criado dois dias antes da live presidencial de 29 de julho de 2021, contendo orientações detalhadas:


"A credibilidade da urna já se esvaiu, assim como a reputação de ministros do STF. (...) Estas questões que devem ser massificadas".


A defesa tentou desqualificar as colaborações premiadas, mas o depoimento de Mauro César Barbosa Cid, confirmado em múltiplas ocasiões, oferece detalhes precisos sobre o funcionamento da organização criminosa, incluindo a confirmação de que:


"o então Presidente sempre dava esperanças que algo fosse acontecer para convencer as Forças Armadas a concretizarem o golpe".

Principais argumentos e teses da PGR

Eixo Temático

Tese Central da PGR

Evidências Chave

Organização Criminosa

Jair Bolsonaro liderou grupo que estruturou “Punhal Verde Amarelo” para golpe; foi mantido “gabinete central de crise”

– Planilhas “Operação Luneta” e “Op. 142” (ABIN, GSI)


– Arquivos “Presidente TSE informa.docx” (ABIN)

Ataques ao Sistema Eleitoral

Sustentou campanha de deslegitimação das urnas e das decisões do TSE, aprofundando ódio e desconfiança

– Live de 29.7.2021 com menção a “uso da força”


– Planilha “REU DIRETRIZES ESTRATÉGICAS” (GSI)

Coação do Poder Judiciário

Planejava prisão de ministros do STF e do TSE e descumprimento de decisões judiciais

– Minuta de decreto de Estado de Sítio e Operação GLO;


– Anotações sobre “neutralizar a capacidade do Min. AM”

Conivência Militar

Reuniões ministeriais convocadas por Bolsonaro continham falas de generais a favor de golpe

– Gravação 5.7.2022 (computador de Mauro Cid): “o que tiver que ser feito é antes das eleições”

Violência em 08/01/2023

Grupo auxiliou mobilização e escolta policial para invasão do STF e Congresso

– Depoimentos e documentos sobre coordenação de trânsito de ônibus e escolta por PMDF


A questão da liberdade de expressão versus direitos da personalidade, abordada no Recurso Extraordinário com Agravo 1.516.984, oferece paralelos relevantes. O Ministro Alexandre de Moraes, relator tanto deste caso quanto do processo dos atos golpistas, estabeleceu que "não há direito absoluto à liberdade de expressão" e que é necessário "ponderar, no caso concreto" os direitos em conflito.


As estratégias de defesa apresentadas pelos advogados de Bolsonaro, embora tecnicamente elaboradas, enfrentam o desafio de confrontar um conjunto probatório extenso e diversificado. A tentativa de negar participação direta nos eventos esbarra em documentos, mensagens e depoimentos que sugerem coordenação e conhecimento dos planos golpistas.


A alegação de cerceamento de defesa, comum em processos complexos, não parece suficiente para invalidar provas que foram regularmente colhidas e disponibilizadas. O argumento sobre ausência de violência física ignora a evolução doutrinária sobre crimes de atentado contra as instituições democráticas.


O julgamento representa um marco na história judicial brasileira, testando não apenas a responsabilização de um ex-presidente, mas a capacidade das instituições democráticas de se protegerem contra ameaças internas. As estratégias defensivas, diante da robustez das evidências apresentadas pela PGR, sugerem que o caminho para a absolvição será íngreme, exigindo dos ministros do STF uma análise criteriosa entre garantias processuais e proteção da ordem democrática.

 
 
 

Estratégia jurídica tenta inverter narrativa da acusação, mas enfrenta contradições nos próprios depoimentos e documentos apresentados pela PGR


A sustentação oral apresentada ontem pelo advogado Hendre Fernandes Farias em defesa do general Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira no julgamento do chamado "núcleo 1" da tentativa de golpe de Estado revelou uma estratégia jurídica arriscada: usar o próprio delator da acusação para construir a tese de inocência de seu cliente.


Paulo Sérgio Nogueira - Foto: JuriNews
Paulo Sérgio Nogueira - Foto: JuriNews

"A delação e o depoimento da principal testemunha da acusação, o comandante da Força Aérea, Brigadeiro Batista Júnior, é contundente, acachapante em falar que o general Paulo Sérgio atuou [...] para demover o presidente de incursar, de caminhar por qualquer medida de exceção", argumentou o defensor.

A estratégia representa uma tentativa audaciosa de inverter completamente a narrativa apresentada pela Procuradoria-Geral da República, que acusa o ex-ministro da Defesa de ter sido peça-chave na articulação golpista. Segundo a denúncia, Paulo Sérgio:


"reuniu os Comandantes militares para lhes propor ato consumativo de golpe, obtendo a adesão do Comandante da Marinha e a recusa dos Comandantes das outras duas Armas".

A construção do "Pacificador"


O advogado construiu um retrato quase heroico de seu cliente, apresentando-o como um:


"bravo guerreiro do Nordeste" que, aos 11 anos, deixou a família para estudar no Colégio Militar de Fortaleza. "Mal sabia, digo eu, que a vida ali estava lhe forjando e lhe aperfeiçoando e lhe preparando para o momento decisivo da história nacional", declarou Farias.

A narrativa da defesa coloca Paulo Sérgio como alguém que "honrou a memória do nosso pacificador" - referência ao Duque de Caxias - ao se posicionar:


"totalmente contrário a qualquer medida de exceção" e atuar "ativamente para demover o presidente da República de qualquer medida nesse sentido".

Contudo, essa versão enfrenta contradições diretas com os elementos probatórios reunidos pela investigação. Conforme a denúncia da PGR, o general participou ativamente das reuniões onde foram apresentadas as minutas de decretos golpistas, incluindo a reunião do dia 14 de dezembro de 2022, quando "apresentou a minuta de Decreto mais abrangente" aos comandantes militares.



O peso das provas documentais


A principal fragilidade da estratégia defensiva reside no conjunto robusto de provas documentais apresentado pela acusação. A PGR demonstra que Paulo Sérgio não apenas conhecia os planos golpistas, como teve papel ativo em sua execução.


O documento apreendido na residência do ex-ministro Anderson Torres, transcrito integralmente na denúncia, revela a existência de uma minuta de decreto que previa:


"Estado de Defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral" e a criação de uma "Comissão de Regularidade Eleitoral" composta majoritariamente por membros do Ministério da Defesa.

"Fica estipulado o prazo de 30 (trinta) dias para cumprimento da ordem estabelecida", estabelecia o documento, que previa ainda a suspensão de direitos fundamentais, incluindo "sigilo de correspondência e de comunicação telemática e telefônica dos membros do Tribunal do Superior Eleitoral".

A Questão da Cronologia


A defesa também enfrenta desafios relacionados à cronologia dos eventos. Enquanto o advogado argumenta que Paulo Sérgio agiu para "dissuadir o presidente", a PGR apresenta uma sequência detalhada de reuniões e documentos que sugerem participação ativa até dezembro de 2022.


O colaborador Mauro Cid, conforme registrado na denúncia, confirmou que:


"no dia 7.12.2022, o Decreto foi apresentado pela primeira vez a integrantes do alto escalão do Governo Federal" em reunião no Palácio da Alvorada, onde estavam presentes "JAIR BOLSONARO, com auxílio de FILIPE GARCIA MARTINS PEREIRA, apresentou a minuta ao General Freire Gomes, ao Almirante de Esquadra ALMIR GARNIER SANTOS e ao General e Ministro da Defesa PAULO SERGIO NOGUEIRA DE OLIVEIRA".

A estratégia da defesa cria uma contradição interna significativa. Se Paulo Sérgio realmente atuou para impedir o golpe desde o início, conforme alegado, por que permaneceu participando das reuniões golpistas até dezembro? Por que não denunciou formalmente os planos?


O advogado tentou responder a essa questão afirmando que o general buscava:


"unidade contra qualquer medida de exceção" e que "todo mundo aqui falar a mesma língua para dissuadir o presidente".

Contudo, essa explicação não se alinha com a gravidade dos documentos encontrados nem com o testemunho do próprio Freire Gomes, que confirmou a apresentação da minuta golpista.


Implicações jurídicas


Do ponto de vista jurídico, a estratégia da defesa enfrenta o desafio de explicar como alguém que supostamente se opunha ao golpe acabou sendo peça central na estrutura organizacional descrita pela PGR. A denúncia situa Paulo Sérgio no "núcleo crucial da organização criminosa", junto com outras figuras de destaque do governo.


A tese de que o general sofreu "ataques" por sua posição contrária ao golpe, mencionada pelo advogado, pode até ter algum fundamento factual, mas não exime o acusado de eventual participação anterior nos atos preparatórios do crime.


O julgamento representa um teste importante para o sistema judicial brasileiro na análise de crimes contra o Estado Democrático de Direito. A robustez das provas documentais e testimoniais apresentadas pela PGR sugere que a estratégia defensiva, por mais eloquente que seja na construção de uma narrativa alternativa, enfrenta obstáculos significativos para desconstruir o conjunto probatório reunido durante a investigação.


A decisão final dos ministros do Supremo Tribunal Federal dependerá da avaliação sobre qual narrativa - a da acusação ou a da defesa - encontra maior respaldo no conjunto de provas dos autos.

 
 
 

O julgamento da ação penal sobre os atos golpistas de 8 de janeiro ganhou contornos dramáticos na tarde desta terça-feira, quando a defesa do General Walter Souza Braga Netto apresentou suas estratégias para tentar desconstruir as acusações do Ministério Público Federal. Em sustentação oral de uma hora, os advogados Celso Sanchez Vilarde e Paulo Amador Tomás Alves da Cunha centraram fogo na credibilidade do delator Mauro Cid e questionaram a robustez das provas apresentadas pela Procuradoria-Geral da República.


Braga Netto - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Braga Netto - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

A Estratégia do Ataque à Delação Premiada


A linha central da defesa concentrou-se em desqualificar sistematicamente o depoimento de Mauro Cid, principal testemunha de acusação.


"Essa delação não fica em pé de jeito nenhum", declarou enfaticamente o advogado Celso Sanchez Vilarde ao Supremo Tribunal Federal.

A estratégia revela uma aposta arriscada: desmontar todo o edifício acusatório atacando sua principal coluna de sustentação.


O advogado questionou as múltiplas versões apresentadas pelo delator sobre a suposta entrega de dinheiro por Braga Netto para financiar operações golpistas.


"A primeira declaração sobre o dinheiro foi no dia 21 de novembro de 2024, data da entrega. Segundo depoimento, em 5 de dezembro de 2024. Isso nós estamos, evidentemente, que tá juntado aos autos", argumentou Vilarde, tentando demonstrar inconsistências temporais.

Contudo, essa estratégia enfrenta um obstáculo significativo. A denúncia da PGR não se baseia exclusivamente no depoimento de Mauro Cid, mas em um conjunto probatório diversificado que inclui documentos apreendidos, registros de geolocalização e interceptações de mensagens. Como destaca o documento do Ministério Público:


"A denúncia não se baseou em conjecturas ou suposições frágeis. Os próprios integrantes da organização criminosa fizeram questão de documentar quase todas as fases da empreitada."

O Problema das Versões Contraditórias


A defesa explorou exaustivamente as contradições nos depoimentos de Mauro Cid sobre local e data da suposta entrega de recursos.


"Local da entrega, Palácio do Planalto ou da Alvorada. Segundo depoimento (...) Local da entrega. Eu tenho quase certeza que foi no Alvorada (...) 9/06 no interrogatório nesta Corte no Supremo Tribunal Federal. Data da entrega. É aí depois acho que realmente o espaço temporal não me recordo", citou o advogado, tentando demonstrar a fragilidade da versão acusatória.

Essa linha argumentativa, embora compreensível do ponto de vista defensivo, pode soar inadequada diante da gravidade das acusações. A PGR documentou um esquema complexo denominado "Operação Copa 2022", que previa "ações de monitoramento e neutralização de autoridades públicas", incluindo o próprio Ministro Alexandre de Moraes, relator do caso.


A Questão dos Prints e da Cadeia de Custódia


Outra frente de ataque da defesa concentrou-se na alegada fragilidade das provas digitais.


"E o que tem, o que a PGR fala que tem de prova contra o meu cliente são oito prints", argumentou Vilarde, sustentando que "prints não tem validade nenhuma" segundo jurisprudência consolidada.

O advogado foi além, alegando adulteração:


"Os prints que o Ministério Público se relaciona, eles foram adulterados. Nós juntamos um parecer disso (...) porque não tem uma cadeia de custódia".

Conversa entre Braga Netto e Ailton Barros, em 14 de dezembro de 2022 (STF/Reprodução)
Conversa entre Braga Netto e Ailton Barros, em 14 de dezembro de 2022 (STF/Reprodução)

Essa argumentação técnica busca minar a credibilidade das conversas por aplicativo que supostamente demonstrariam a coordenação de ataques virtuais contra o alto comando do Exército.


A Negativa de Participação no 8 de Janeiro


No que se refere aos eventos de 8 de janeiro, a defesa adotou estratégia de negação total de envolvimento.


"O Ministério Público aponta três circunstâncias que segundo a ótica da acusação, teria a participação de Braganeto em 8 de janeiro", enumerou Vilarde, rebatendo cada uma delas.

Sobre as mensagens do General Mário Fernandes solicitando intervenção de Braga Netto, a defesa argumentou:


"Qual foi a participação de Braga Neto? Nenhuma. Ele não responde o áudio do general Mário Fernandes e não grava vídeo nenhum, áudio nenhum."

Essa estratégia de não-participação, contudo, contrasta com as evidências reunidas pela PGR, que demonstram não apenas envolvimento passivo, mas liderança ativa. Segundo a denúncia:


"JAIR MESSIAS BOLSONARO, junto com WALTER SOUZA BRAGA NETTO, integrantes do alto escalão do Governo Federal e das Forças Armadas, formaram o núcleo crucial da organização criminosa."

As Fragilidades da Estratégia Defensiva


A análise das sustentações revela três fragilidades principais na estratégia da defesa:


  1. Primeira, a concentração excessiva na descredibilização de Mauro Cid ignora o vasto material probatório independente. A PGR possui registros de ERB (Estação Rádio Base) que comprovam deslocamentos suspeitos, documentos manuscritos apreendidos e uma rede de comunicações digitais que transcende o depoimento do delator.

  2. Segunda, a negativa absoluta de participação nos eventos soa inadequada diante de provas documentais robustas. A denúncia da PGR cita especificamente o papel de Braga Netto no financiamento de operações: "MAURO CID esclareceu o meio encontrado pela organização criminosa para obter o montante necessário à realização da operação, ressaltando o relevante papel de BRAGA NETTO no financiamento da ação."

  3. Terceira, a estratégia ignora o contexto mais amplo da organização criminosa. Mesmo que conseguisse desconstruir pontos específicos, a defesa não ofereceu explicação alternativa plausível para o conjunto de evidências que apontam coordenação sistemática entre os acusados.


A denúncia da PGR apresenta um quadro que vai muito além de depoimentos isolados. Inclui a apreensão do plano:


"Punhal Verde Amarelo", que previa "ações de monitoramento contra autoridades públicas" e chegava a cogitar "a morte por envenenamento de Luiz Inácio Lula da Silva."

O documento revela ainda que:


"três cópias do plano 'Punhal Verde Amarelo' foram novamente impressas no Palácio do Planalto por MÁRIO FERNANDES em 6.12.2022, às 18h09, exatamente na mesma data de conclusão das reuniões preparatórias do Decreto golpista."

Durante as sustentações, ficou evidente a tensão entre direito de defesa e gravidade institucional das acusações. O próprio relator, Ministro Alexandre de Moraes, já havia observado na abertura do julgamento que:


"as instituições brasileiras são fortes e sólidas e seus integrantes foram forjados no mais puro espírito democrático da Constituição de 1988."

A defesa de Braga Netto, ao final de sua sustentação, apelou para princípios fundamentais:


"A impunidade deixa cicatriz na democracia. É verdade. Mas a condenação de um inocente, a condenação de alguém sem provas, deixa uma ferida aberta para sempre."

Perspectivas para a Continuidade do Julgamento


O julgamento prosseguirá na próxima terça-feira, quando os ministros da Primeira Turma deverão proferir seus votos. A estratégia da defesa de Braga Netto, embora tecnicamente competente em pontos específicos, parece enfrentar o desafio de confrontar um conjunto probatório abrangente e detalhado.


A PGR construiu sua acusação não apenas sobre depoimentos, mas sobre documentos, registros técnicos e um padrão de comportamento que, segundo a denúncia, caracteriza:


"organização criminosa constituída desde pelo menos o dia 29 de junho de 2021 e operando até o dia 8 de janeiro de 2023, com o emprego de armas."

O veredicto final caberá aos ministros, que deverão ponderar entre as garantias constitucionais do devido processo legal e a necessidade de responsabilização por atos que, nas palavras do próprio Ministério Público, representaram:


"o maior ataque na história do Brasil a respeito da democracia pós-Constituição de 1988."

A estratégia defensiva revelada nas sustentações, embora explore pontos técnicos relevantes, parece insuficiente para desconstruir a narrativa consolidada pela acusação sobre uma conspiração de amplitude inédita contra as instituições democráticas brasileiras.

 
 
 
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