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Defesa de Braga Netto: Estratégias jurídicas enfrentam robusto conjunto probatório da PGR

  • Foto do escritor: Raul Silva
    Raul Silva
  • 4 de set.
  • 5 min de leitura

O julgamento da ação penal sobre os atos golpistas de 8 de janeiro ganhou contornos dramáticos na tarde desta terça-feira, quando a defesa do General Walter Souza Braga Netto apresentou suas estratégias para tentar desconstruir as acusações do Ministério Público Federal. Em sustentação oral de uma hora, os advogados Celso Sanchez Vilarde e Paulo Amador Tomás Alves da Cunha centraram fogo na credibilidade do delator Mauro Cid e questionaram a robustez das provas apresentadas pela Procuradoria-Geral da República.


Braga Netto - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Braga Netto - Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

A Estratégia do Ataque à Delação Premiada


A linha central da defesa concentrou-se em desqualificar sistematicamente o depoimento de Mauro Cid, principal testemunha de acusação.


"Essa delação não fica em pé de jeito nenhum", declarou enfaticamente o advogado Celso Sanchez Vilarde ao Supremo Tribunal Federal.

A estratégia revela uma aposta arriscada: desmontar todo o edifício acusatório atacando sua principal coluna de sustentação.


O advogado questionou as múltiplas versões apresentadas pelo delator sobre a suposta entrega de dinheiro por Braga Netto para financiar operações golpistas.


"A primeira declaração sobre o dinheiro foi no dia 21 de novembro de 2024, data da entrega. Segundo depoimento, em 5 de dezembro de 2024. Isso nós estamos, evidentemente, que tá juntado aos autos", argumentou Vilarde, tentando demonstrar inconsistências temporais.

Contudo, essa estratégia enfrenta um obstáculo significativo. A denúncia da PGR não se baseia exclusivamente no depoimento de Mauro Cid, mas em um conjunto probatório diversificado que inclui documentos apreendidos, registros de geolocalização e interceptações de mensagens. Como destaca o documento do Ministério Público:


"A denúncia não se baseou em conjecturas ou suposições frágeis. Os próprios integrantes da organização criminosa fizeram questão de documentar quase todas as fases da empreitada."

O Problema das Versões Contraditórias


A defesa explorou exaustivamente as contradições nos depoimentos de Mauro Cid sobre local e data da suposta entrega de recursos.


"Local da entrega, Palácio do Planalto ou da Alvorada. Segundo depoimento (...) Local da entrega. Eu tenho quase certeza que foi no Alvorada (...) 9/06 no interrogatório nesta Corte no Supremo Tribunal Federal. Data da entrega. É aí depois acho que realmente o espaço temporal não me recordo", citou o advogado, tentando demonstrar a fragilidade da versão acusatória.

Essa linha argumentativa, embora compreensível do ponto de vista defensivo, pode soar inadequada diante da gravidade das acusações. A PGR documentou um esquema complexo denominado "Operação Copa 2022", que previa "ações de monitoramento e neutralização de autoridades públicas", incluindo o próprio Ministro Alexandre de Moraes, relator do caso.


A Questão dos Prints e da Cadeia de Custódia


Outra frente de ataque da defesa concentrou-se na alegada fragilidade das provas digitais.


"E o que tem, o que a PGR fala que tem de prova contra o meu cliente são oito prints", argumentou Vilarde, sustentando que "prints não tem validade nenhuma" segundo jurisprudência consolidada.

O advogado foi além, alegando adulteração:


"Os prints que o Ministério Público se relaciona, eles foram adulterados. Nós juntamos um parecer disso (...) porque não tem uma cadeia de custódia".

Conversa entre Braga Netto e Ailton Barros, em 14 de dezembro de 2022 (STF/Reprodução)
Conversa entre Braga Netto e Ailton Barros, em 14 de dezembro de 2022 (STF/Reprodução)

Essa argumentação técnica busca minar a credibilidade das conversas por aplicativo que supostamente demonstrariam a coordenação de ataques virtuais contra o alto comando do Exército.


A Negativa de Participação no 8 de Janeiro


No que se refere aos eventos de 8 de janeiro, a defesa adotou estratégia de negação total de envolvimento.


"O Ministério Público aponta três circunstâncias que segundo a ótica da acusação, teria a participação de Braganeto em 8 de janeiro", enumerou Vilarde, rebatendo cada uma delas.

Sobre as mensagens do General Mário Fernandes solicitando intervenção de Braga Netto, a defesa argumentou:


"Qual foi a participação de Braga Neto? Nenhuma. Ele não responde o áudio do general Mário Fernandes e não grava vídeo nenhum, áudio nenhum."

Essa estratégia de não-participação, contudo, contrasta com as evidências reunidas pela PGR, que demonstram não apenas envolvimento passivo, mas liderança ativa. Segundo a denúncia:


"JAIR MESSIAS BOLSONARO, junto com WALTER SOUZA BRAGA NETTO, integrantes do alto escalão do Governo Federal e das Forças Armadas, formaram o núcleo crucial da organização criminosa."

As Fragilidades da Estratégia Defensiva


A análise das sustentações revela três fragilidades principais na estratégia da defesa:


  1. Primeira, a concentração excessiva na descredibilização de Mauro Cid ignora o vasto material probatório independente. A PGR possui registros de ERB (Estação Rádio Base) que comprovam deslocamentos suspeitos, documentos manuscritos apreendidos e uma rede de comunicações digitais que transcende o depoimento do delator.

  2. Segunda, a negativa absoluta de participação nos eventos soa inadequada diante de provas documentais robustas. A denúncia da PGR cita especificamente o papel de Braga Netto no financiamento de operações: "MAURO CID esclareceu o meio encontrado pela organização criminosa para obter o montante necessário à realização da operação, ressaltando o relevante papel de BRAGA NETTO no financiamento da ação."

  3. Terceira, a estratégia ignora o contexto mais amplo da organização criminosa. Mesmo que conseguisse desconstruir pontos específicos, a defesa não ofereceu explicação alternativa plausível para o conjunto de evidências que apontam coordenação sistemática entre os acusados.


A denúncia da PGR apresenta um quadro que vai muito além de depoimentos isolados. Inclui a apreensão do plano:


"Punhal Verde Amarelo", que previa "ações de monitoramento contra autoridades públicas" e chegava a cogitar "a morte por envenenamento de Luiz Inácio Lula da Silva."

O documento revela ainda que:


"três cópias do plano 'Punhal Verde Amarelo' foram novamente impressas no Palácio do Planalto por MÁRIO FERNANDES em 6.12.2022, às 18h09, exatamente na mesma data de conclusão das reuniões preparatórias do Decreto golpista."

Durante as sustentações, ficou evidente a tensão entre direito de defesa e gravidade institucional das acusações. O próprio relator, Ministro Alexandre de Moraes, já havia observado na abertura do julgamento que:


"as instituições brasileiras são fortes e sólidas e seus integrantes foram forjados no mais puro espírito democrático da Constituição de 1988."

A defesa de Braga Netto, ao final de sua sustentação, apelou para princípios fundamentais:


"A impunidade deixa cicatriz na democracia. É verdade. Mas a condenação de um inocente, a condenação de alguém sem provas, deixa uma ferida aberta para sempre."

Perspectivas para a Continuidade do Julgamento


O julgamento prosseguirá na próxima terça-feira, quando os ministros da Primeira Turma deverão proferir seus votos. A estratégia da defesa de Braga Netto, embora tecnicamente competente em pontos específicos, parece enfrentar o desafio de confrontar um conjunto probatório abrangente e detalhado.


A PGR construiu sua acusação não apenas sobre depoimentos, mas sobre documentos, registros técnicos e um padrão de comportamento que, segundo a denúncia, caracteriza:


"organização criminosa constituída desde pelo menos o dia 29 de junho de 2021 e operando até o dia 8 de janeiro de 2023, com o emprego de armas."

O veredicto final caberá aos ministros, que deverão ponderar entre as garantias constitucionais do devido processo legal e a necessidade de responsabilização por atos que, nas palavras do próprio Ministério Público, representaram:


"o maior ataque na história do Brasil a respeito da democracia pós-Constituição de 1988."

A estratégia defensiva revelada nas sustentações, embora explore pontos técnicos relevantes, parece insuficiente para desconstruir a narrativa consolidada pela acusação sobre uma conspiração de amplitude inédita contra as instituições democráticas brasileiras.

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