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Por: Raul Silva - Jornalista do Radar Literário


As plataformas digitais, inicialmente celebradas por sua capacidade de conectar pessoas e democratizar o acesso à informação, tornaram-se, paradoxalmente, vetores exponenciais para a difusão de ideologias extremistas. Esse fenômeno é resultado da confluência de múltiplos fatores estruturais e comportamentais, desde a arquitetura algorítmica das redes sociais até padrões cognitivos que favorecem a radicalização. À medida que a digitalização se torna onipresente na vida social, o impacto das plataformas sobre os discursos públicos e as decisões políticas se intensifica. A ascensão do extremismo digital, sustentada por algoritmos que reforçam bolhas ideológicas e potencializada pela atuação estratégica de grupos organizados, coloca em risco não apenas a estabilidade democrática, mas também a própria coesão do tecido social.


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imbarney22/ Getty Images


Os memes, artefatos culturais replicáveis de rápida disseminação, desempenham um papel central na propagação de ideologias extremistas e teorias da conspiração. De acordo com um estudo do Instituto para a Segurança e o Comportamento Digital (IDSB) da Universidade de Bath, grupos extremistas instrumentalizam memes como veículos de doutrinação e recrutamento, permitindo a circulação de mensagens simplificadas e altamente emocionalizadas. Essas representações visuais não apenas consolidam narrativas internas, mas também servem como um mecanismo de captação, inserindo progressivamente novos indivíduos em ambientes digitais radicalizados. Esse fenômeno, longe de ser acidental, é amplamente documentado na literatura acadêmica sobre persuasão ideológica e psicologia das massas.


Os algoritmos das plataformas sociais, projetados para maximizar o tempo de engajamento do usuário, frequentemente amplificam conteúdos que geram respostas emocionais intensas. Estudos empíricos demonstram que esses sistemas atuam como catalisadores da radicalização, expondo usuários a materiais cada vez mais extremos conforme interagem com conteúdos de natureza polarizadora. A lógica subjacente é econômica: postagens que evocam indignação, medo e raiva tendem a atrair maior interação, prolongando a permanência dos usuários na plataforma. Assim, em vez de favorecer um ecossistema informacional equilibrado, os algoritmos reforçam viéses cognitivos preexistentes, deteriorando o espaço público do debate democrático.


O fenômeno da propaganda computacional, amplamente documentado por instituições de pesquisa como a Oxford Internet Institute, revela a utilização sistemática de "tropas cibernéticas" por governos e grupos políticos para manipular a opinião pública. Essas estratégias incluem o uso de automação, perfis falsos e redes coordenadas para disseminação de desinformação, ataques a opositores e direcionamento da narrativa política. No Brasil, essa prática tem sido empregada de maneira recorrente, minando a credibilidade das instituições democráticas e exacerbando a polarização ideológica. A influência dessas campanhas se estende para além do ambiente digital, impactando diretamente processos eleitorais, a confiança na imprensa e o próprio comportamento político dos cidadãos.


Pesquisas indicam uma crescente normalização da cultura do ódio nos espaços digitais. Um levantamento conduzido pela Universidade Internacional de La Rioja (UNIR) revelou que mais de 50% das interações em redes sociais contêm discursos de ódio, frequentemente direcionados contra minorias e grupos vulneráveis. Essa constatação sugere não apenas a presença de uma estrutura discursiva violenta, mas também um processo de legitimação desse tipo de linguagem. Ao se tornar parte do cotidiano digital, o discurso de ódio passa a ser percebido como aceitável, reduzindo as barreiras morais e aumentando a predisposição para a intolerância. Essa dinâmica é reforçada pelo caráter anônimo das interações virtuais, que reduz a responsabilização individual e estimula comportamentos mais agressivos e hostis. 


A ascensão das ideologias extremistas nas plataformas digitais representa um desafio incontornável para as democracias contemporâneas. Estudos longitudinais demonstram que os algoritmos de recomendação favorecem a difusão de conteúdos políticos radicais, conferindo vantagem desproporcional a discursos extremistas e minando a qualidade do debate público. Essa realidade evidencia a necessidade urgente de regulamentação mais robusta e de mecanismos de transparência tecnológica que possam mitigar os impactos da desinformação e proteger os processos democráticos. O impacto desse fenômeno não se limita ao campo eleitoral, mas se estende para a formação de opinião, para a percepção da realidade social e para a segurança de grupos marginalizados.


Embora as mídias digitais proporcionem benefícios inegáveis, seu papel como vetores de radicalização exige respostas contundentes. A conjunção de algoritmos polarizadores, a manipulação informacional promovida por agentes políticos e a disseminação sistemática do discurso de ódio constituem ameaças concretas ao equilíbrio democrático. Para enfrentar esse cenário, é essencial adotar uma abordagem multidimensional que contemple desde a regulação das plataformas até iniciativas de letramento digital e educação midiática. Apenas por meio de um esforço coordenado entre governos, sociedade civil e setor privado será possível mitigar os impactos negativos da desinformação e da radicalização online, preservando a integridade do espaço público e fortalecendo os alicerces da convivência democrática.


Fontes:

 
 
 

Por: Raul Silva - Jornalista do Radar Literário


O fenômeno da ascensão da apologia ao nazismo no Brasil, evidenciado por um aumento de 242% nos últimos cinco anos, reflete um complexo conjunto de fatores sociopolíticos e culturais que demandam uma análise aprofundada. Dados da Polícia Federal e de organizações como a SaferNet indicam uma escalada preocupante no volume de ocorrências, predominantemente concentradas em estados como São Paulo, Rio Grande do Sul, Paraná e Rio de Janeiro. O crescimento desse fenômeno não ocorre de maneira isolada, mas sim inserido em um contexto global de recrudescimento de movimentos ultraconservadores, impulsionados por discursos revisionistas e pela reinterpretação da liberdade de expressão como um salvo-conduto para a propagação do ódio.


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A Lei nº 7.716/89, criada para coibir manifestações que incitam o racismo e o neonazismo, enfrenta desafios imensos na contemporaneidade, especialmente no cenário digital. A multiplicação de conteúdos extremistas em plataformas como Twitter, Instagram e TikTok evidencia a ineficácia dos mecanismos de controle, exacerbada pela lógica algorítmica que privilegia o engajamento em detrimento da responsabilidade ética. Estudos da SaferNet demonstram que mais de 20 mil denúncias anuais envolvem crimes de ódio, dos quais uma parcela significativa está vinculada à difusão de símbolos e ideologias neonazistas. A fragilidade das regulações e a ambiguidade das diretrizes de moderação dessas plataformas contribuem para a consolidação desse cenário.


O crescimento exponencial das ocorrências, que saltaram de um patamar residual em 2020 para mais de 80 casos registrados formalmente em 2023, ilustra uma perigosa banalização de discursos racistas e antidemocráticos. O fenômeno apresenta variações regionais relevantes, com grandes centros urbanos despontando como epicentros da radicalização, exigindo políticas públicas que sejam tanto nacionais quanto localmente calibradas. Além disso, investigações apontam para a existência de redes organizadas que promovem encontros clandestinos e disseminam propaganda extremista em ambientes digitais subterrâneos, como fóruns na deep web e grupos de mensagens criptografadas.


A vulnerabilidade da juventude nesse processo é um dos aspectos mais alarmantes. Estudos indicam que jovens, em busca de pertencimento e identidade, são alvos preferenciais de grupos neonazistas que operam por meio de estratégias sofisticadas de recrutamento digital. Esses espaços promovem uma construção narrativa que mescla revisionismo histórico, teorias conspiratórias e um discurso de exclusividade, prometendo aos adeptos uma posição de distinção dentro de uma suposta elite racial e ideológica. O acesso precoce a essas comunidades, muitas vezes facilitado pela negligência institucional na educação digital, acelera processos de radicalização e dificulta intervenções preventivas.


No âmbito político, a ascensão de discursos extremistas reflete uma deterioração do debate público. Pesquisas da Fundação Getulio Vargas (FGV) indicam que, em anos eleitorais, há um aumento na circulação de simbologia nazista e discursos de ódio nas redes sociais, muitas vezes instrumentalizados por candidatos e grupos políticos que buscam deslegitimar adversários e amplificar divisões sociais. Essa instrumentalização revela a insuficiência da regulação digital e a necessidade de mecanismos mais eficazes de responsabilização de agentes públicos que, de forma deliberada ou negligente, fomentam discursos que relativizam ou normalizam manifestações neonazistas.


O enfrentamento dessa tendência requer um esforço multidimensional, que perpassa desde o fortalecimento das políticas de regulação digital até a implementação de estratégias educativas robustas, focadas no letramento crítico e na cidadania digital. A desconstrução do discurso neonazista deve ser conduzida por meio de uma abordagem interdisciplinar, que envolva historiadores, sociólogos, educadores e especialistas em segurança digital. Além disso, a cooperação entre organismos governamentais, instituições acadêmicas e sociedade civil se torna imprescindível para a criação de programas eficazes de monitoramento e intervenção.


O Brasil, ao longo de sua história, consolidou-se como uma nação plural e marcada por uma rica diversidade cultural. Entretanto, a crescente presença do neonazismo e a normalização do discurso de ódio representam um desafio crítico para a manutenção dos princípios democráticos. O combate a essa ameaça exige não apenas a repressão jurídica e o endurecimento das penalidades legais, mas também um compromisso coletivo com a educação para a cidadania, a preservação da memória histórica e a valorização da diversidade como fundamento de uma sociedade justa e equitativa.


A escalada da apologia ao nazismo no Brasil não pode ser subestimada. Cada ocorrência registrada deve ser compreendida não apenas como um evento isolado, mas como parte de uma conjuntura que, se não contida, pode corroer as bases democráticas do país. A sociedade brasileira precisa transformar cada dado alarmante em um chamado à ação, convertendo o enfrentamento ao extremismo em uma prioridade nacional, sustentada por políticas públicas eficazes, regulação digital responsável e um compromisso inegociável com os valores humanistas e democráticos.


Fontes:



 
 
 
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