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Brasília – Em um discurso que mesclou com maestria análise política, referências à cultura popular e um apelo literário de profundo significado, a senadora Teresa Leitão (PT-PE) consolidou-se como uma das vozes centrais na articulação pela rejeição da controversa "PEC da Blindagem" na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Mesmo não sendo membro titular da comissão, a senadora fez questão de comparecer para o que previu ser um "Grand final", entregando uma fala cirúrgica que dissecou ponto a ponto as fragilidades da proposta, não apenas em seu mérito questionável, mas em sua própria e viciada concepção.


Por Raul Silva, para O estopim | 24 de setembro de 2025


Confira nossa análise em áudio

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A retórica de coragem e ética da Senadora Teresa Leitão O estopim


Senadora Tereza Leitão (PT-PE) CCJ do Senado - Geraldo Magela/Agência Senado
Senadora Teresa Leitão (PT-PE) CCJ do Senado - Geraldo Magela/Agência Senado

A análise do pronunciamento de Leitão revela uma estratégia argumentativa, que atacou a Proposta de Emenda à Constituição em quatro frentes principais: a ilegitimidade congênita de sua origem, a força irrefreável da pressão popular, o risco de ser um catalisador para um mal-estar social mais profundo e, por fim, a exaltação da coragem política como um dever ético e uma resposta à altura do momento histórico. A fala foi um microcosmo da tensão que dominava o Congresso, transformando uma votação em comissão num ato de afirmação institucional.


O "Pecado Original" da Proposta


O primeiro e mais contundente argumento da senadora visou deslegitimar a PEC antes mesmo de debater seu conteúdo. Para ela, a proposta já "nasceu errada", carregando um vício de origem insanável. Com uma crítica direta e afiada ao processo que a originou, Leitão afirmou:


"um processo de tanta abrangência não pode ser fruto de pequenos grupos ou de grupos que querem chantagear ou de grupos que querem mostrar uma força momentânea de acordo com a conjuntura".

A crítica, embora não nominal, era um recado claro sobre os perigos da "pauta-bomba" e da legislação reativa, concebida não para o bem público, mas como demonstração de poder ou moeda de troca.


Neste ponto, a senadora ecoa posicionamentos passados onde defendeu a primazia do debate público sobre os arranjos de bastidores. Em uma audiência na Comissão de Direitos Humanos em 2024, sobre a reforma do sistema eleitoral, Leitão declarou que:


"a democracia se fortalece com a luz do sol, não com sussurros em corredores escuros. Qualquer mudança estrutural precisa ser parida pelo debate amplo, ou nasce natimorta".

A crítica de hoje na CCJ é uma aplicação direta dessa filosofia, enquadrando a PEC não como uma iniciativa legislativa genuína, mas como um instrumento de pressão que, em suas palavras, "desabona o processo e o mérito". Ela sugere que qualquer benefício que a proposta pudesse conter foi irremediavelmente contaminado por sua gênese, tornando-a indefensável.


A "Voz Rouca das Ruas" e a Legitimidade


Em um segundo momento, a senadora trouxe para o centro do debate a reação da sociedade, o ator externo que redefiniu os rumos da votação. Citando o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, ela invocou a "voz rouca das ruas" como o elemento que conferiu ao Senado a legitimidade e, talvez, a força necessária para barrar a proposta. Segundo ela, essa voz:


"dá a esse momento de hoje um corte de legitimidade muito forte e a sintonia que precisa existir entre o poder legislativo [...] e o próprio povo".

Era o reconhecimento de que a política não se faz apenas dentro do palácio, e que a soberania popular, quando manifesta, não pode ser ignorada.


Ao fazê-lo, Leitão não apenas reconheceu a pressão externa, mas a transformou em um pilar de sua argumentação. Ela validou os protestos como uma manifestação democrática essencial, um termômetro que o Parlamento não poderia ignorar. A mensagem era clara: a rejeição à PEC não seria uma derrota de um grupo político, mas uma vitória da sintonia entre representantes e representados.


Usando um dito popular, a senadora aprofundou a análise da insatisfação pública: "quem não pode com a formiga não atice o formigueiro". Ela alertou que, embora parte da mobilização tenha sido organizada por entidades, houve uma grande parcela "espontânea, se revelando contra nós". Para Leitão, a PEC pode ter sido apenas o "desaguador de um inconformismo, de uma negação da política que atrapalha a democracia". Foi um aviso severo aos seus pares de que a crise de representatividade é real e que esta proposta, vista como um ato de autoproteção corporativista, era o combustível perfeito para incendiar a desconfiança popular.


Veja a fala da Senadora Teresa Leitão (PT-PE) na integra


Imunidade não é impunidade: a defesa da ética


Ao elogiar o relatório do senador Otto Alencar, que recomendou a rejeição da PEC, Teresa Leitão destacou o que considerou seu aspecto mais crucial: a distinção clara, didática e fundamental entre prerrogativas republicanas e privilégios inaceitáveis.


"Imunidade não é impunidade. As palavras até se parecem, mas tem um significado absolutamente diverso", frisou, elogiando a precisão técnica e jurídica do parecer.

Ela fez questão de martelar esse ponto, ciente de que, para o público externo, a discussão poderia soar como uma tentativa de parlamentares garantirem privilégios.


Esta tem sido uma bandeira constante da senadora. Em discursos anteriores sobre o decoro parlamentar, Leitão já havia sido enfática ao afirmar que:


"a imunidade parlamentar é uma ferramenta da democracia para garantir a liberdade de expressão e voto, não um escudo para proteger indivíduos de suas responsabilidades civis e criminais".

Ao destacar este ponto no relatório de Vieira, ela reforçou que a rejeição da PEC era também um ato de fortalecimento da ética no Parlamento, alinhando os aspectos jurídicos aos princípios morais que, segundo ela, devem reger a vida pública. O voto, portanto, não era apenas técnico, mas um posicionamento sobre o tipo de República que se desejava construir: uma em que a lei vale para todos, inclusive para quem as faz.


O apelo final: "O que a vida quer da gente é Coragem"


O clímax do discurso, foi seu parágrafo final. Em um gesto de deferência ao relator e de reverência à cultura brasileira, a senadora releu a citação de João Guimarães Rosa, presente no relatório, extraída da obra-prima "Grande Sertão: Veredas". A passagem, na voz do personagem Riobaldo, serviu como uma convocação à responsabilidade histórica dos senadores presentes, um chamado que transcendia a política cotidiana.


"O querer da vida embrulha tudo. A vida é assim. Esquenta e esfria aperta e daí afrouxa sossega e depois das inquieta O que ela quer da gente é coragem." 

Ao trazer a sabedoria árida e profunda do sertão para o ambiente formal da CCJ, Leitão universalizou o dilema. Não se tratava mais de uma emenda constitucional, mas de um teste de fibra. Ao concluir com um direto e sonoro "Tenhamos coragem de rejeitar essa PEC", ela elevou o debate do campo puramente político para o da ética e da virtude cívica. A mensagem final não era apenas sobre votar contra uma proposta, mas sobre demonstrar a coragem que o momento exigia, reafirmando o valor e a dignidade da própria política.


Em poucos, mas densos minutos, o discurso de Teresa Leitão conseguiu tecer uma narrativa coesa e poderosa, transformando a votação de um item polêmico em um momento pedagógico sobre o papel do Legislativo, sua relação com a sociedade e a integridade de seus membros. Foi uma aula de como a retórica, quando embasada em convicção e conectada ao sentimento popular, ainda é a ferramenta mais potente da democracia.

 
 
 

BRASÍLIA | A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal aprovou por unanimidade nesta quarta-feira, 24 de setembro, o parecer do relator Alessandro Vieira (MDB-SE) pela rejeição da PEC da Blindagem. Com 26 votos contrários e nenhum favorável, a decisão arquiva definitivamente a controversa proposta que pretendia ampliar a proteção judicial para parlamentares, representando uma vitória da pressão popular exercida nas manifestações realizadas em todas as capitais no último domingo.


Por Raul Silva, para O estopim | 24 de setembro de 2025


Confira nossa análise em áudio – E agora? O que vem por aí?

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PEC da Blindagem: rejeição unânime no Senado, graças a pressão popular

CCJ no Senado - Foto: Geraldo Magela/Agência Senado
CCJ no Senado - Foto: Geraldo Magela/Agência Senado

Em uma decisão histórica nesta quarta-feira, 24 de setembro de 2025, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal aprovou por unanimidade o parecer do relator Alessandro Vieira (MDB-SE) contrário à PEC da Blindagem, sepultando definitivamente a proposta que havia gerado uma das maiores ondas de indignação popular dos últimos anos. Com 26 votos favoráveis à rejeição e nenhum contrário, os senadores enterraram a controversa Proposta de Emenda à Constituição nº 3 de 2021, que pretendia ampliar a proteção judicial para parlamentares.


A votação unânime pela rejeição da PEC marca um momento decisivo no cenário político brasileiro, representando uma vitória da pressão popular exercida nas manifestações realizadas em todas as 27 capitais do país no último domingo, 21 de setembro. A decisão da CCJ encerra definitivamente qualquer possibilidade de tramitação da proposta no Senado, uma vez que, segundo o regimento interno, quando há unanimidade na rejeição por inconstitucionalidade, a matéria é considerada arquivada sem necessidade de recurso ao plenário.


Voto histórico de Alessandro Vieira


Durante a sessão da CCJ, que começou às 9h conforme programado, Alessandro Vieira leu integralmente seu parecer pela "inconstitucionalidade, injuridicidade e rejeição" da PEC da Blindagem. Em um dos momentos mais contundentes de sua fala, o senador sergipano declarou que:


"essa é uma PEC que definitivamente abre as portas do Congresso Nacional para o crime organizado".

O relator fundamentou sua posição em três pilares principais: desvio de finalidade, inconstitucionalidade e atentado à moralidade pública. Segundo Vieira, embora a PEC se apresentasse como um instrumento de defesa das prerrogativas parlamentares, seu:


"real objetivo não é o interesse público, mas sim os anseios escusos de figuras públicas que pretendem impedir ou, ao menos, retardar, investigações criminais".

O senador Alessandro Vieira (MDB-SE) - Imagem_ Edilson Rodrigues - 28.fev.2024_Agência Senado
O senador Alessandro Vieira (MDB-SE) - Imagem_ Edilson Rodrigues - 28.fev.2024_Agência Senado

O parecer de Alessandro Vieira detalhou minuciosamente os problemas constitucionais da proposta. Ele argumentou que a PEC violava princípios fundamentais como os da publicidade, moralidade e republicano, além de representar um "gigantesco passo atrás" no tocante à transparência. O relator também criticou duramente a reintrodução do voto secreto para deliberações sobre processos criminais contra parlamentares, classificando a medida como uma "agressão ao princípio constitucional da publicidade".


Vieira apresentou dados históricos para sustentar seu argumento: entre 1988 e 2001, quando vigorava regra similar à proposta pela PEC, de quase 300 pedidos de investigação enviados ao Congresso, apenas um foi autorizado pela Câmara dos Deputados - o caso do deputado Jabes Rabelo, acusado de receptação de veículo roubado.


"Retornar à imunidade processual existente anteriormente à Emenda Constitucional nº 35, de 2001, representa permitir a impunidade", afirmou o relator.

Unanimidade inédita marca decisão


A unanimidade da votação surpreendeu até mesmo os observadores mais otimistas quanto à rejeição da PEC. Todos os 26 senadores presentes na sessão da CCJ votaram favoravelmente ao parecer de Alessandro Vieira, sem qualquer voto em separado ou pedido de vista que pudesse adiar a decisão. O resultado demonstrou o impacto das manifestações populares e da pressão da sociedade civil organizada sobre os parlamentares.


Segundo relatos da sessão, mesmo senadores que inicialmente haviam manifestado posições mais favoráveis à proposta mudaram de posicionamento. O senador Jorge Seif (PL-SC), que havia apresentado voto separado favorável, retirou seu apoio à PEC durante a própria reunião, reconhecendo ter sido influenciado pelas manifestações populares.


"Eu preciso reconhecer que a população, não falo de esquerda, falo direita, esquerda e centro, que entrou em contato conosco e nós precisamos estar sensíveis às vozes das ruas", declarou Seif.

A aprovação unânime do parecer contrário representou uma vitória direta da pressão popular exercida nas ruas. As manifestações de domingo, que reuniram milhares de pessoas em todas as capitais brasileiras, foram decisivas para consolidar a posição contrária dos senadores. Otto Alencar, presidente da CCJ, havia afirmado previamente ter "costurado um número significativo de votos contrários à matéria", citando 18 na CCJ e cerca de 50 no plenário, atribuindo essa mobilização às manifestações.


O próprio Alessandro Vieira reconheceu em seu parecer a importância da pressão popular, citando que "a sociedade brasileira grita em sentido diametralmente oposto" ao que propunha a PEC, "ou seja, ela almeja o fim da impunidade". O senador concluiu seu voto com uma citação de Guimarães Rosa, fazendo uma homenagem ao presidente da CCJ e um apelo para que o Senado tivesse "coragem" de rejeitar a proposta.


Veja como foi o parecer do Senador Alesandro Vieira (MDB - SE) na íntegra


Consequências políticas e institucionais


A decisão unânime da CCJ representa um marco no enfrentamento entre os poderes e na luta contra a impunidade no Brasil. A PEC da Blindagem havia sido aprovada na Câmara dos Deputados com 353 votos favoráveis e 134 contrários em setembro de 2025, mas encontrou resistência absoluta no Senado Federal.


Segundo levantamentos anteriores à votação, mais de 60 senadores já haviam manifestado publicamente posição contrária à proposta. O MDB, partido do relator, foi um dos primeiros a fechar questão contra o texto, seguido por diversas outras bancadas. Até mesmo senadores da oposição e aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro manifestaram-se contra a proposta, demonstrando que a rejeição atravessou linhas partidárias.


Com a aprovação unânime do parecer pela rejeição na CCJ, a PEC da Blindagem está definitivamente arquivada. O regimento interno do Senado prevê que, quando há unanimidade na rejeição por inconstitucionalidade, não há possibilidade de recurso ao plenário. Isso significa que a proposta não poderá mais tramitar em nenhuma das Casas do Congresso Nacional, encerrando um capítulo controverso da política brasileira.


Alessandro Vieira destacou durante a sessão que não fazia:


"sentido deixar esse texto rodando pelas Casas esperando uma oportunidade, uma janela para aprovação da blindagem".

Para o relator, a proteção ao mandato parlamentar já é suficientemente garantida pela Constituição atual, sem necessidade de criar novos mecanismos que poderiam favorecer a impunidade.


A decisão da CCJ representa uma vitória da democracia brasileira e da pressão popular organizada, demonstrando que a sociedade civil continua vigilante contra tentativas de retrocesso institucional. O resultado unânime enviou uma mensagem clara de que o Senado Federal não compactuará com propostas que possam favorecer a impunidade ou enfraquecer o combate à corrupção no país.


Argumentos Centrais da Rejeição


Em seu relatório, Vieira foi incisivo ao caracterizar a PEC como um caso flagrante de desvio de finalidade.


"A PEC que formalmente aponta ser um instrumento de defesa do Parlamento é na verdade um golpe fatal na sua legitimidade, posto que configura portas abertas para a transformação do Legislativo em abrigo seguro para criminosos de todos os tipos", declarou o senador em seu parecer.

O relator baseou sua argumentação no conceito jurídico de desvio de finalidade, citando a doutrina de Caio Tácito, que sustenta que "toda e qualquer competência discricionária tem como limite a observância da finalidade que lhe é própria". Segundo Vieira, o objetivo real da proposta não é proteger o exercício da atividade parlamentar, mas sim atender:


"os anseios escusos de figuras públicas que pretendem impedir ou, ao menos, retardar, investigações criminais que possam vir a prejudicá-los".

Vieira sustentou seus argumentos com dados históricos contundentes. O senador lembrou que, entre 1988 e 2001, quando vigorava regra similar à proposta pela PEC:


"apenas 1, entre quase 300 pedidos de investigação, foi aprovado pela Câmara dos Deputados, contra o Deputado Jabes Rabelo, acusado de receptação de veículo roubado".

"Não à toa, aquele estado de coisas absolutamente inconstitucional exigiu a promulgação de referida emenda à Carta Maior, como medida urgente de moralização", afirmou o relator

Referindo-se à Emenda Constitucional nº 35, de 2001, que extinguiu a necessidade de autorização prévia para processar parlamentares.


O senador destacou que atualmente há mais de duas centenas de parlamentares investigados ou processados, demonstrando que a Emenda Constitucional de 2001 "teve sucesso em reduzir a impunidade, ainda tão presente em nosso País".


Leia o parecer completo do Senador Alessando Vieira (MDB - SE)


Críticas Específicas aos Dispositivos da PEC


Alessandro Vieira criticou duramente o retorno ao voto secreto previsto na PEC, considerando-o um "gigantesco passo atrás no tocante à transparência". O relator argumentou que essa previsão anula decisões importantes anteriores do Congresso, especialmente a Emenda Constitucional nº 76, de 2013, que aboliu a votação secreta em casos de perda de mandato e apreciação de vetos.


"Prever, assim, o voto secreto em deliberações parlamentares, como faz a PEC nº 3, de 2021, se traduz não apenas em agressão ao princípio constitucional da publicidade, assegurado no caput do art. 37 da Carta Magna, como em violação da própria ideia da democracia representativa", sustentou Vieira.

O relator também criticou a ampliação do foro privilegiado aos presidentes de partidos políticos, qualificando a medida como "providência totalmente desarrazoada". Segundo Vieira, trata-se de:


"verdadeira distorção do instituto, que, doutrinariamente, se destina a ocupantes de elevados cargos públicos".

Durante sua fala na CCJ, Vieira fez referência direta às manifestações populares do domingo anterior (21), afirmando que:


"a sociedade brasileira grita em sentido diametralmente oposto, ou seja, ela almeja o fim da impunidade, como as amplas manifestações públicas sinalizaram no último domingo".

O senador foi categórico ao afirmar que a PEC "definitivamente abre as portas do Congresso Nacional para o crime organizado". Em entrevistas anteriores, Vieira já havia caracterizado a proposta como "imprestável" e alertado que ela poderia proteger "autores de crimes graves, como corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa".


Refutação de Argumentos Favoráveis


Vieira rejeitou especificamente as emendas apresentadas pelos senadores Sérgio Moro e Carlos Portinho, que pretendiam limitar a "blindagem" apenas aos crimes contra a honra. O relator argumentou que:


"existe jurisprudência farta e antiga sobre a matéria, estabelecendo a não aplicabilidade da imunidade material a pronunciamentos difamantes, injuriosos ou caluniosos sem vínculo com a atividade parlamentar".

Para ilustrar sua posição, Vieira citou casos concretos de parlamentares processados por crimes contra a honra, incluindo André Janones (que chamou Bolsonaro de "assassino, miliciano, ladrão de joias e bandido fujão") e deputados da oposição que fizeram declarações sobre Gleisi Hoffman. O relator considerou "absolutamente impossível atrelar tais agressões ao legítimo exercício do mandato parlamentar".


O senador rejeitou enfaticamente a narrativa de que parlamentares estariam sendo perseguidos por suas opiniões.


"A narrativa segundo a qual a atividade parlamentar se encontra cerceada no Brasil não se sustenta em fatos", afirmou Vieira.

Durante sua fala na CCJ, o relator foi direto:


"Aqui, nesta fileira, seguramente todos já proferiram discursos duríssimos com relação a decisões de ministros [do STF], a condutas de ministros, e nenhum dos que está aqui sentado responde a processo por isso. Nenhum! Nem aqui, nem na outra Casa".

Em suas declarações, Vieira demonstrou preocupação específica com a proteção que a PEC ofereceria ao crime organizado. O senador alertou que a proposta abriria espaço para proteção de "homicídio, corrupção passiva, tráfico de drogas e lavagem de dinheiro".


Esta preocupação ecoa investigações recentes que revelaram conexões entre emendas parlamentares e facções criminosas, evidenciando como o crime organizado tem tentado infiltrar-se na política através de licitações fraudulentas em municípios.


Consequências políticas e institucionais


Ao concluir seu parecer, Alessandro Vieira foi enfático: "votamos pela inconstitucionalidade, injuridicidade e rejeição da Proposta de Emenda à Constituição nº 3, de 2021". O relator encerrou sua análise citando Guimarães Rosa:


"O que ela [a vida] quer da gente é coragem", elogiando o presidente da CCJ, Otto Alencar, "pela coragem de pautar com a urgência devida essa matéria absurda".

A posição de Vieira reflete um consenso crescente no Senado contra a PEC. Levantamentos jornalísticos indicam que pelo menos 55 dos 81 senadores já se manifestaram contrários à proposta, sinalizando sua provável rejeição tanto na CCJ quanto no plenário.


O caso da "PEC da Blindagem" representa mais um momento de tensão institucional no Brasil, onde questões de prerrogativas parlamentares, transparência democrática e combate à impunidade se entrelaçam. A análise técnica e contundente de Alessandro Vieira estabelece parâmetros jurídicos claros para o debate, fundamentando a oposição à proposta em princípios constitucionais sólidos e precedentes históricos que demonstram os riscos de retrocesso institucional.

 
 
 

O domingo, 21 de setembro de 2025, marcou um dos dias mais significativos da mobilização democrática brasileira recente, com manifestações simultâneas em pelo menos 33 cidades contra a PEC da Blindagem e o PL da Anistia. Entre os destaques desse movimento nacional pela democracia, a cidade de Arcoverde, no sertão pernambucano, protagonizou uma das mobilizações mais representativas do interior do país, reunindo diversas forças políticas de esquerda em defesa dos princípios democráticos e do Estado de Direito.


Manifestação contra a PEC da Blindagem e PL da Anistia - Fonte: Reprodução
Manifestação contra a PEC da Blindagem e PL da Anistia - Fonte: Reprodução

Mobilização nacional e internacional contra a Blindagem


As manifestações, convocadas pela Frente Povo Sem Medo e Frente Brasil Popular, reuniram milhares de pessoas em capitais como São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Salvador, Recife e outras 28 cidades. O movimento, que ganhou dimensões internacionais, contou com protestos em Londres, Berlim, Paris e Lisboa, demonstrando a repercussão global da questão democrática brasileira.


Avenida Paulista - Ato contra a PEC da Blindagem - Foto: Reprodução TV Globo
Avenida Paulista - Ato contra a PEC da Blindagem - Foto: Reprodução TV Globo

Em São Paulo, o Monitor do Debate Político da USP contabilizou 42,4 mil pessoas no ápice da manifestação na Avenida Paulista, número ligeiramente superior ao registrado no ato bolsonarista de 7 de setembro. No Rio de Janeiro, artistas como Caetano Veloso, Chico Buarque, Gilberto Gil e Djavan se apresentaram em Copacabana, transformando o protesto em um grande ato cultural.


A PEC da Blindagem, aprovada pela Câmara dos Deputados em 16 de setembro, estabelece que parlamentares só podem ser investigados criminalmente com autorização de suas respectivas casas legislativas, em votação secreta. Críticos apontam que, quando regra similar vigorou entre 1988 e 2001, apenas uma investigação foi autorizada entre mais de 250 solicitações.


Recife e Pernambuco na linha de frente


Em Pernambuco, as manifestações ganharam especial relevância. No Recife, cerca de 50 mil pessoas, segundo organizadores, participaram de uma passeata que saiu do Ginásio Pernambucano, na Rua da Aurora, e seguiu até o Marco Zero. O ato teve caráter político-cultural, com dois trios elétricos apresentando atrações da cultura popular pernambucana.


Ato no Recife contra anistia e PEC da Blindagem reuniu 50 mil pessoas, segundo organizadores — Foto: Ezequiel Quirino/TV Globo
Ato no Recife contra anistia e PEC da Blindagem reuniu 50 mil pessoas, segundo organizadores — Foto: Ezequiel Quirino/TV Globo

A capital pernambucana registrou um contraste político significativo: enquanto o prefeito João Campos (PSB) se posicionou publicamente contra a PEC da Blindagem, sua bancada partidária na Câmara dos Deputados votou a favor da proposta. "Sou totalmente contrário à PEC da Blindagem. Não votei e não orientei a bancada do PSB na Câmara a votar a favor", declarou o prefeito, tentando se distanciar da decisão partidária que incluiu o voto favorável de seu próprio irmão, o deputado Pedro Campos.


Um dos aspectos mais notáveis do cenário político pernambucano foi a ausência de posicionamento inicial da governadora Raquel Lyra (PSD) sobre a PEC da Blindagem. Somente após pressão da imprensa e da sociedade civil, em 19 de setembro, Lyra se manifestou contrária à proposta, afirmando que "não dialoga com o sentimento do povo".


Contudo, sua posição tardia contrastou com a atuação de seu partido, o PSD, que orientou voto favorável à PEC na Câmara. A situação se tornou ainda mais emblemática considerando que Lyra migrou do PSDB para o PSD em março de 2025, após divergências com a linha política nacional tucana. Seu partido anterior, o PSDB, também não se posicionou claramente contra a medida no âmbito nacional.


A governadora, que se elegeu com forte apoio popular em 2022, enfrentou críticas por não ter se manifestado espontaneamente contra uma proposta que atinge diretamente os princípios democráticos que defendeu durante sua campanha eleitoral.


Arcoverde: um símbolo da Resistência Democrática


Entre todas as manifestações realizadas no interior do país, Arcoverde se destacou como um verdadeiro símbolo da luta democrática. A cidade do sertão pernambucano concentrou uma das mobilizações mais plurais e representativas, reunindo praticamente todo o espectro da esquerda política local.


Manifestação em Arcoverde PE - Foto: Raul Silva (O estopim)
Manifestação em Arcoverde PE - Foto: Raul Silva (O estopim)

O ato na cidade contou com uma mobilização contundente contra a PEC da Blindagem e o PL da Anistia. Entre os presentes ao ato estavam militantes do PT, PCdoB, PV, PSOL, Unidade Popular (UP) e PCBR, bem como artistas, professores, a Juventude Petista, representantes da CTB e CNTE, com destaque para lideranças políticas locais como Alexandre Gomes (PCdoB), Draiton Albuquerque (PT/Sindicato dos Bancários), professora Sueli Maria (PT/Sintepe/CNTE), Guilherme Ribeiro (presidente do PT de Arcoverde), Anne Cavalcante (UP), Preto Monte (PSOL de Recife), e Leandro Macedo (PCBR).


O presidente da Câmara de Vereadores de Arcoverde, Luciano Pacheco (MDB), fez uma participação rápida no evento, demonstrando apoio institucional à causa democrática. Pacheco, eleito em janeiro de 2025 para presidir o Legislativo municipal no biênio 2025-2026, é formado em Direito e possui longa trajetória política no município.



Por outro lado, a ausência do prefeito Zeca Cavalcanti (Podemos) foi notória e simbólica. Assim como sua aliada política, a governadora Raquel Lyra, o gestor municipal não se posicionou publicamente sobre a PEC da Blindagem ou o PL da Anistia, contrastando com a postura de diversos prefeitos e governadores pelo país que se manifestaram contrariamente às propostas.


Em contrapartida, a vereadora Célia Galindo (Podemos), decana da Câmara Municipal com 10 mandatos consecutivos, se posicionou frontalmente contra a PEC através de entrevista anterior ao evento. "Nós, representantes do povo, temos que ser exemplo e não exceção. A Constituição é clara: todos são iguais perante a lei", declarou a parlamentar, criticando duramente o que chamou de "PEC da Bandidagem".


O contexto Político Nacional


As manifestações ocorreram em um momento de grave tensão política nacional. A PEC da Blindagem foi aprovada na Câmara com 353 votos favoráveis contra 134 contrários no primeiro turno, e 344 a 133 no segundo. Entre os deputados pernambucanos, 19 dos 25 votaram favoravelmente à proposta.


Paralelamente, o Congresso também aprovou a urgência para o PL da Anistia, que pode beneficiar condenados pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro, condenado a 27 anos e 3 meses de prisão pelo Supremo Tribunal Federal.


No Senado, a PEC encontra forte resistência. O senador Otto Alencar (PSD-BA), presidente da Comissão de Constituição e Justiça, prometeu pautar a proposta na semana seguinte às manifestações "para sepultar de vez esse assunto". O relator Alessandro Vieira (MDB-SE) já sinalizou parecer pela rejeição.


Repercussões e Significado Histórico


As manifestações de 21 de setembro de 2025 representaram um marco na resistência democrática brasileira contemporânea. A mobilização simultânea em dezenas de cidades, com apoio de artistas, intelectuais, movimentos sociais e partidos políticos, demonstrou a vitalidade da sociedade civil brasileira na defesa das instituições democráticas.


Arcoverde, ao concentrar uma das mobilizações mais representativas do interior brasileiro, consolidou-se como um símbolo da resistência democrática no sertão pernambucano. A cidade, com cerca de 75 mil habitantes, mostrou que a defesa da democracia transcende os grandes centros urbanos e encontra eco nas mais diversas regiões do país.


O contraste entre a mobilização popular e o silêncio de autoridades como o prefeito Zeca Cavalcanti e o posicionamento tardio da governadora Raquel Lyra evidenciou as tensões políticas existentes mesmo entre gestores que se apresentam como democráticos.


As manifestações também revelaram a capacidade de articulação das forças progressistas brasileiras, que conseguiram organizar protestos coordenados nacionalmente em poucas semanas, mobilizando desde grandes centros urbanos até cidades do interior, passando por comunidades brasileiras no exterior.


Perspectivas futuras


Com a PEC da Blindagem seguindo para o Senado e o PL da Anistia em tramitação acelerada, o movimento democrático brasileiro demonstrou estar organizado e vigilante. As manifestações de setembro estabeleceram um precedente importante: a sociedade brasileira não aceitará passivamente retrocessos democráticos ou tentativas de blindagem da classe política contra a Justiça.


Arcoverde, com sua mobilização exemplar, inseriu-se definitivamente no mapa da resistência democrática nacional, provando que a luta pela manutenção do Estado de Direito encontra eco em todos os cantos do Brasil. A cidade do sertão pernambucano, berço de importantes lideranças políticas regionais, reafirmou sua vocação histórica de protagonismo nos momentos decisivos da vida nacional.


O dia 21 de setembro de 2025 ficará registrado como um marco da democracia brasileira, e Arcoverde poderá se orgulhar de ter estado na linha de frente dessa batalha histórica pela preservação dos valores republicanos e democráticos do país.

 
 
 
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