Manifestações históricas contra a PEC da Blindagem e o PL da Anistia mobilizam o Brasil, com destaque para Arcoverde
- Raul Silva

- 21 de set.
- 5 min de leitura
O domingo, 21 de setembro de 2025, marcou um dos dias mais significativos da mobilização democrática brasileira recente, com manifestações simultâneas em pelo menos 33 cidades contra a PEC da Blindagem e o PL da Anistia. Entre os destaques desse movimento nacional pela democracia, a cidade de Arcoverde, no sertão pernambucano, protagonizou uma das mobilizações mais representativas do interior do país, reunindo diversas forças políticas de esquerda em defesa dos princípios democráticos e do Estado de Direito.

Mobilização nacional e internacional contra a Blindagem
As manifestações, convocadas pela Frente Povo Sem Medo e Frente Brasil Popular, reuniram milhares de pessoas em capitais como São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Salvador, Recife e outras 28 cidades. O movimento, que ganhou dimensões internacionais, contou com protestos em Londres, Berlim, Paris e Lisboa, demonstrando a repercussão global da questão democrática brasileira.

Em São Paulo, o Monitor do Debate Político da USP contabilizou 42,4 mil pessoas no ápice da manifestação na Avenida Paulista, número ligeiramente superior ao registrado no ato bolsonarista de 7 de setembro. No Rio de Janeiro, artistas como Caetano Veloso, Chico Buarque, Gilberto Gil e Djavan se apresentaram em Copacabana, transformando o protesto em um grande ato cultural.
A PEC da Blindagem, aprovada pela Câmara dos Deputados em 16 de setembro, estabelece que parlamentares só podem ser investigados criminalmente com autorização de suas respectivas casas legislativas, em votação secreta. Críticos apontam que, quando regra similar vigorou entre 1988 e 2001, apenas uma investigação foi autorizada entre mais de 250 solicitações.
Recife e Pernambuco na linha de frente
Em Pernambuco, as manifestações ganharam especial relevância. No Recife, cerca de 50 mil pessoas, segundo organizadores, participaram de uma passeata que saiu do Ginásio Pernambucano, na Rua da Aurora, e seguiu até o Marco Zero. O ato teve caráter político-cultural, com dois trios elétricos apresentando atrações da cultura popular pernambucana.

A capital pernambucana registrou um contraste político significativo: enquanto o prefeito João Campos (PSB) se posicionou publicamente contra a PEC da Blindagem, sua bancada partidária na Câmara dos Deputados votou a favor da proposta. "Sou totalmente contrário à PEC da Blindagem. Não votei e não orientei a bancada do PSB na Câmara a votar a favor", declarou o prefeito, tentando se distanciar da decisão partidária que incluiu o voto favorável de seu próprio irmão, o deputado Pedro Campos.
Um dos aspectos mais notáveis do cenário político pernambucano foi a ausência de posicionamento inicial da governadora Raquel Lyra (PSD) sobre a PEC da Blindagem. Somente após pressão da imprensa e da sociedade civil, em 19 de setembro, Lyra se manifestou contrária à proposta, afirmando que "não dialoga com o sentimento do povo".
Contudo, sua posição tardia contrastou com a atuação de seu partido, o PSD, que orientou voto favorável à PEC na Câmara. A situação se tornou ainda mais emblemática considerando que Lyra migrou do PSDB para o PSD em março de 2025, após divergências com a linha política nacional tucana. Seu partido anterior, o PSDB, também não se posicionou claramente contra a medida no âmbito nacional.
A governadora, que se elegeu com forte apoio popular em 2022, enfrentou críticas por não ter se manifestado espontaneamente contra uma proposta que atinge diretamente os princípios democráticos que defendeu durante sua campanha eleitoral.
Arcoverde: um símbolo da Resistência Democrática
Entre todas as manifestações realizadas no interior do país, Arcoverde se destacou como um verdadeiro símbolo da luta democrática. A cidade do sertão pernambucano concentrou uma das mobilizações mais plurais e representativas, reunindo praticamente todo o espectro da esquerda política local.

O ato na cidade contou com uma mobilização contundente contra a PEC da Blindagem e o PL da Anistia. Entre os presentes ao ato estavam militantes do PT, PCdoB, PV, PSOL, Unidade Popular (UP) e PCBR, bem como artistas, professores, a Juventude Petista, representantes da CTB e CNTE, com destaque para lideranças políticas locais como Alexandre Gomes (PCdoB), Draiton Albuquerque (PT/Sindicato dos Bancários), professora Sueli Maria (PT/Sintepe/CNTE), Guilherme Ribeiro (presidente do PT de Arcoverde), Anne Cavalcante (UP), Preto Monte (PSOL de Recife), e Leandro Macedo (PCBR).
O presidente da Câmara de Vereadores de Arcoverde, Luciano Pacheco (MDB), fez uma participação rápida no evento, demonstrando apoio institucional à causa democrática. Pacheco, eleito em janeiro de 2025 para presidir o Legislativo municipal no biênio 2025-2026, é formado em Direito e possui longa trajetória política no município.
Por outro lado, a ausência do prefeito Zeca Cavalcanti (Podemos) foi notória e simbólica. Assim como sua aliada política, a governadora Raquel Lyra, o gestor municipal não se posicionou publicamente sobre a PEC da Blindagem ou o PL da Anistia, contrastando com a postura de diversos prefeitos e governadores pelo país que se manifestaram contrariamente às propostas.
Em contrapartida, a vereadora Célia Galindo (Podemos), decana da Câmara Municipal com 10 mandatos consecutivos, se posicionou frontalmente contra a PEC através de entrevista anterior ao evento. "Nós, representantes do povo, temos que ser exemplo e não exceção. A Constituição é clara: todos são iguais perante a lei", declarou a parlamentar, criticando duramente o que chamou de "PEC da Bandidagem".
O contexto Político Nacional
As manifestações ocorreram em um momento de grave tensão política nacional. A PEC da Blindagem foi aprovada na Câmara com 353 votos favoráveis contra 134 contrários no primeiro turno, e 344 a 133 no segundo. Entre os deputados pernambucanos, 19 dos 25 votaram favoravelmente à proposta.
Paralelamente, o Congresso também aprovou a urgência para o PL da Anistia, que pode beneficiar condenados pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro, condenado a 27 anos e 3 meses de prisão pelo Supremo Tribunal Federal.
No Senado, a PEC encontra forte resistência. O senador Otto Alencar (PSD-BA), presidente da Comissão de Constituição e Justiça, prometeu pautar a proposta na semana seguinte às manifestações "para sepultar de vez esse assunto". O relator Alessandro Vieira (MDB-SE) já sinalizou parecer pela rejeição.
Repercussões e Significado Histórico
As manifestações de 21 de setembro de 2025 representaram um marco na resistência democrática brasileira contemporânea. A mobilização simultânea em dezenas de cidades, com apoio de artistas, intelectuais, movimentos sociais e partidos políticos, demonstrou a vitalidade da sociedade civil brasileira na defesa das instituições democráticas.
Arcoverde, ao concentrar uma das mobilizações mais representativas do interior brasileiro, consolidou-se como um símbolo da resistência democrática no sertão pernambucano. A cidade, com cerca de 75 mil habitantes, mostrou que a defesa da democracia transcende os grandes centros urbanos e encontra eco nas mais diversas regiões do país.
O contraste entre a mobilização popular e o silêncio de autoridades como o prefeito Zeca Cavalcanti e o posicionamento tardio da governadora Raquel Lyra evidenciou as tensões políticas existentes mesmo entre gestores que se apresentam como democráticos.
As manifestações também revelaram a capacidade de articulação das forças progressistas brasileiras, que conseguiram organizar protestos coordenados nacionalmente em poucas semanas, mobilizando desde grandes centros urbanos até cidades do interior, passando por comunidades brasileiras no exterior.
Perspectivas futuras
Com a PEC da Blindagem seguindo para o Senado e o PL da Anistia em tramitação acelerada, o movimento democrático brasileiro demonstrou estar organizado e vigilante. As manifestações de setembro estabeleceram um precedente importante: a sociedade brasileira não aceitará passivamente retrocessos democráticos ou tentativas de blindagem da classe política contra a Justiça.
Arcoverde, com sua mobilização exemplar, inseriu-se definitivamente no mapa da resistência democrática nacional, provando que a luta pela manutenção do Estado de Direito encontra eco em todos os cantos do Brasil. A cidade do sertão pernambucano, berço de importantes lideranças políticas regionais, reafirmou sua vocação histórica de protagonismo nos momentos decisivos da vida nacional.
O dia 21 de setembro de 2025 ficará registrado como um marco da democracia brasileira, e Arcoverde poderá se orgulhar de ter estado na linha de frente dessa batalha histórica pela preservação dos valores republicanos e democráticos do país.




















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